Pedro Araújo
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A Morte e a Moda

07 de novembro de 2024

Pedro Araújo


MORTE – Outra vez você… Ultimamente tem estado bastante animada.

MODA – É o desejo que me consome, como o sabes. Mais do que antes, tenho me aproximado de ti, como a uma irmã.

MORTE – Compreendo-a. Por experiência, sei que costumo coadjuvar a beleza. De todo modo, o seu poder é tanto que hoje ele domina até o que não se crê, por exemplo, roupas infantis em mulheres maduras, músicas mais do que insuportáveis e figuras corporais sem significado algum.

MODA – Quá-quá-quá. A minha vida é o foder, tal qual antigamente. Desse modo, o que tenho conseguido efetuar é o nada ser — o que sou eu mesma —, mas as possibilidades são tantas de o ser, todas propostas por mim, como o sabes, que a cada irrelevância se lhe acrescentam outros vários mimos que a fazem desejável. Devo-te confessar que realizo algumas novidades por vezes, ainda que o sob a tua ascendência, já que estás para além sempre de mim, tais quais um ‘tradicionalismo revolucionário’, o que julgarias, pela tua própria mãe ‘a Verdade’, que é o meu fim e a quem tu obedeces, um equívoco lógico, outro universo que tu abranges.

MORTE – Bem expresso, querida. Mas lhe digo que a sinceridade nunca é de seu feitio, por isso você é, de uso, baixa. Esta reflexão sua realizada por si mesma a mim é um quebra-correntes, objeto que lhe é repugnante. Ao contrário, se não o fosse, a sua personalidade entraria, dizia-se assim, ‘em parafuso’, mais um termo que você fez esquecer, como sói.

MODA – Pensarei a respeito.